Ontem à noite, eu passei pelo parque e te vi comendo um punhado de florezinhas. Não, não comendo. Cheirando. Você estava de shorts e moletom de capuz, devia estar marcando uns 15 graus. Você é tão fodona, tão durona, que eu jamais pensaria que você cheira flores. Que dirá rosas. Rosas têm um cheiro denso e enjoado de nada. Só as rosas rosa, algumas delas, têm aquele cheiro doce que todo o mundo acha que têm as rosas. Você até parecia dócil segurando aquelas flores. Tinha acabado de chover e tudo cheirava a lama, no final das contas. Até as rosas. Seus tênis de caninho estavam enlamaçados, e até sua meia branca estava respingada de barro. Você tremia, esfregando uma à outra essas duas toras que você chama de pernas. Pernas de bicicleta. Eu julgaria ser um menino, se não fosse você a única pessoa na cidade a usar esse moletom laranja, portanto só podia ser você. Até aí, você sempre parece um menino pra quem vê com olhos distantes. Mas eu sei que por dentro você é uma mocinha, frágil e delicada. Tão frágil, tão quebrável, tão de vidro. Você queria ser blindada, mas não é, então anda sempre de guarda alta pra parecer forte. Mas isso é só mais uma fraqueza sua.
Andei devagar em sua direção. Meus pés faziam splash splosh na grama que já não era mais verde. À contra-luz, não pude ver seu rosto, só vi que você tremeu na base. Ameaçou ir embora. Que medo o meu de ter pensando esse monte de coisa, de achar que te conheço, e aí você não ser você. Como eu ia fazer pra explicar pro meu cérebro que você não era você? Ainda bem que era. Você é inconfundível. Te abracei. Você continuou imóvel. Inerte. Segurando as flores. Forte. Até um espinho te sangrar. Você largou as rosas e parou de tremer. Suas mãos estavam cheias de espinhos. Tudo sangrava. Vem, vamos embora, eu disse. Senti aflição. Você veio. Aliviada.
Andei devagar em sua direção. Meus pés faziam splash splosh na grama que já não era mais verde. À contra-luz, não pude ver seu rosto, só vi que você tremeu na base. Ameaçou ir embora. Que medo o meu de ter pensando esse monte de coisa, de achar que te conheço, e aí você não ser você. Como eu ia fazer pra explicar pro meu cérebro que você não era você? Ainda bem que era. Você é inconfundível. Te abracei. Você continuou imóvel. Inerte. Segurando as flores. Forte. Até um espinho te sangrar. Você largou as rosas e parou de tremer. Suas mãos estavam cheias de espinhos. Tudo sangrava. Vem, vamos embora, eu disse. Senti aflição. Você veio. Aliviada.
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