Pra mim, a graça de uma criança é que, quando ela ainda não se corrompeu querendo ser seu ídolo em tempo integral ou achando que é gente grande, ela é sincera. Sincera porque não tem noção de todos os códigos sociais e morais que existem e que impedem as pessoas de serem sinceras umas com as outras. Me achavam uma criança fresca porque quando me perguntavam se eu gostava da comida que me ofereciam (e em geral perguntavam pra, tipo, lasanha de repolho), eu respondia um 'não' sem pudor. Quem pergunta o que quer, ouve o que não quer. Não é mesmo? Mais errado ainda era perguntar: "Esse macarrão tá igual ao da Tia?" (Tia é a empregada que trabalha aqui em casa desde a idade a pedra. Pra mim, só existia a comida da Tia. O resto era bosta.) "Não". A comida da Tia é a comida da Tia, caraio. Se você não chama Tia, não aprendeu a cozinhar com a Tia nem teve a ajuda dela, sua comida não vai ser igual à dela. ué. E qual é o problema de responder que não? É falta de educação? É deselegante?
Amada por todos ou não, eu era uma criança sincera. E continuo sendo uma pessoa relativamente sincera, mas não tanto uma criança que ainda não discerne "resposta verdadeira" de "resposta conveniente e que deve ser dada". Hoje é assim: "tá meio salgada essa carne mas esse feijão, hmmn... tá uma delícia, viu."